quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Mostra carioca começa nesta quinta com 'thriller' de Pedro Almodóvar que dividiu crítica e público

RIO - Visto por 580 mil pagantes ao longo de quatro semanas em cartaz na Espanha, o thriller "A pele que habito" ("La piel que habito"), produção de 10 milhões que dará a largada para o Festival do Rio 2011 hoje, às 21h, em sessão para convidados, no Odeon, é um manancial de controvérsias na trajetória de Pedro Almodóvar. Aos 62 anos, o cineasta manchego não vem ao Brasil, mas será representado por uma de suas atrizes mais fiéis: a diva Marisa Paredes estará esta noite na cerimônia de abertura da maratona cinéfila, que termina no dia 18. Será a primeira exibição no Brasil do longa-metragem que rachou a crítica em sua passagem por Cannes, cinco meses atrás. Ele entra em cartaz por aqui no dia 4 de novembro.

Inspirada no romance "Tarântula", do francês Thierry Jonquet (1954-2009), a trama está mais próxima da estética de vísceras de David Cronenberg e das ilusões sensoriais de Brian De Palma do que do colorido habitual de Almodóvar. E tem viradas de roteiro que, se contadas, estragam o fator-surpresa. O diretor relutou em aceitar o convite de Cannes para que ninguém revelasse quem é Vera (Elena Anaya), a mulher mantida como cobaia no laboratório onde o cirurgião Robert Ledgard (Antonio Banderas) faz experiências com corpos humanos (vivos). Mas, como tinha chances de levar a Palma de Ouro, Almodóvar acabou competindo. Só conquistou o Prêmio da Juventude e a láurea da Comissão de Técnicos de Cinema pela fotografia de José Luis Alcaine. De quebra, inflamou ânimos na mostra francesa.

- Meu filme se relaciona com o mito de Frankenstein. Mas o que me atraiu no livro de Jonquet foi a grandeza que ele dá ao tema da vingança - explicou Almodóvar ao GLOBO, durante o Festival de Cannes, sempre acompanhado por seu irmão Agustín, que produz todos os seus longas.

Obra-prima ou erro?

Tanto na Croisette quando em sua passagem pelo Festival de Toronto, há um mês, "A pele que habito" foi tachado como "o mais controverso trabalho de Almodóvar". A alcunha pegou depois que o "The New York Times" comparou suas técnicas para criar suspense à linguagem de Hitchcock e que Carlos Boyero, do jornal "El País", acusou a obra de incorrer no patético ao buscar o riso onde deveria haver tragédia. Há quem ache o filme uma obra-prima. Há quem o considere um erro.

- Embora eu nunca respeite os formatos clássicos dos filões cinematográficos, queria me arriscar por gêneros diferentes das comédias pop que fiz no começo da carreira - disse Almodóvar na Croisette. - Aqui, o cinema noir de Fritz Lang me serviu como influência. Tive até o desejo de filmar em preto e branco. Mas "A pele que habito" também traz elementos de "Os olhos sem rosto", de Georges Franju.

Mesmo entre as autoridades culturais espanholas houve indiferença em relação ao longa: ele foi preterido na escolha para representar o país na luta por uma indicação ao Oscar de filme estrangeiro. O selecionado foi "Pa negre", de Agustí Villaronga. Com um faturamento de 4 milhões na Espanha - superior ao desempenho de "Abraços partidos" (2009), trabalho anterior de Almodóvar -, "A pele que habito" virou caso de "ame-o ou deixe-o" em sua estreia na França, na Bélgica e na Inglaterra.

Para o cineasta, as divergências sobre "A pele que habito" não ofuscam a alegria que ele teve ao reencontrar Banderas, seu muso de outrora, nos sets. Rodado em Santiago de Compostela, Toledo e Madri, o filme retoma uma parceria interrompida depois de "Áta-me" (1990). Com Elena Anaya, ele também já tinha filmado: a atriz aparece em "Fale com ela" (2002). No novo longa, o médico vivido por Banderas tem origem brasileira. Interpretada por Marisa Paredes, Marilia, a governanta de Ledgard, tem ligações com o carnaval da Bahia.

Referência ao Brasil no longa

Cannes foi às gargalhadas nas sequências de "A pele que habito" em que Marilia discute com seu filho-problema, Zeca (Roberto Álamo), um folião fantasiado de tigre, que fala um português cheio de sotaque. É Zeca quem sugere que Marilia, empregada (e algo mais) de Ledgard, vem de uma família baiana.

- Tenho encanto pelo clima da Bahia, que conheci ao passar uns dias na casa de Caetano Veloso. E tenho um fascínio pela música popular brasileira - disse o cineasta.

Almodóvar desencavou de um disco de trilhas de filmes brasileiros ("Le Brésil au cinema") a canção "Pelo amor de amar", cantada por Ellen de Lima no longa "Os bandeirantes" (1960), de Marcel Camus. A convite do diretor musical Alberto Iglesias, a cantora Fernanda Cabral (nascida em Brasília e criada na Paraíba) ensinou a espanhola Ana Mena a interpretar "Pelo amor de amar", em português, no longa.

Neste domingo, no Festival do Rio, "A pele que habito" tem sessões abertas ao público às 14h e às 19h no Roxy. Na segunda, o filme volta a ser exibido às 17h e às 21h30m no Estação Sesc, em Botafogo. 

Fonte: O Globo

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